terça-feira, 4 de maio de 2004

Mas o melhor texto sobre os caras saiu no Recife Rock:

Teenage Fanclub e Hell on Wheels expõem DNA do Rock
Gringos provam que são de fato os pais da matéria

por Hugo Montarroyos
02/05/2004


O texto abaixo é uma homenagem (não-póstuma) ao mestre André Forastieri, e contém vários neologismos criados por ele.

...uma noite, cinco horas, uma banda sueca, outra escocesa. Um grupo carioca e dois pernambucanos abrindo. Coisa inimaginável nessas praias até pouco tempo atrás. Sobretudo para nós, jornalistas ligados à música e a cena culturaleba em geral.
Estou boquiaberto até agora por Recife ter sido o primeiro território nacional a ser pisado pelo Teenage Fanclub. Aliás, sou a pessoa menos indicada para falar sobre o TFC, pois fiz jornalismo com o claro objetivo de um dia entrevistar e testemunhar um show deles. E pensar que achava que teria que me deslocar até Galsgow para isso...

Bem, os indies e descolados em geral fizeram a festa no festival "No Ar: Coquetel Molotov". Verdade que o teatro da UFPE não lotou, mas um público considerável deu as caras no evento...

O excelente Parafusa fez um show perfeito. Colocou no bolso todas as outras bandas brasileiras. O som, se duvidar, foi o melhor da noite. E, até que enfim, eis uma banda nacional que sabe usar teclados sem ser chata! E tome marchinha carnavalesca, frevo, samba, MPB. Set list redondinho: "Parece Filme", "Carnaval se Foi", "No Asfalto", "Pode Crer" (linda). Enfim, tem gente que acha que o Parafusa é mera cópia do Los Hermanos (não concordo). Que seja, pois neste caso, a cópia superou, e muito, o original.

Depois o Profiterólis entrou em cena. Pop indie com percussão e um excelente baixista. Mas a sobremesa não me pareceu das mais apetitosas. De impressionar mesmo, o quorum. Muita gente foi ao festival só para vê-los. Agora, a tentativa de fazer poesia concreta como em "Jenipapo" foi medonha. Parte da letra: "Esse licor de jenipapo tá no papo". E eu que reclamava dos tempos do "O Papa é Pop / o Pop Não Poupa Ninguém". Pavoroso.

Ok, os caras da Pelvs são excelentes músicos, o baixista ostentava uma camiseta estampada com a bandeira de Pernambuco, o público curtiu pra cacete, mas o que ficou na memória mesmo foi o som terrivelmente alto e um repertório chaaaaaaaaaaaaaaaato e datado. Pink Floyd demais. Pavement demais. Uma decepção, apesar da aclamação popular.

Quando o sueco Hell on Wheels subiu ao palco, comecei a dar razão à tese do Álvaro Pereira Jr. Segundo ele, nenhuma banda brasileira (exceção feita ao Sepultura, de acordo com o próprio) jamais chegará aos pés de qualquer banda gringa média. Os caras têm rock nas veias. Não tem jeito. Da mesma maneira que o samba e o frevo são nossos, o rock é deles. É cultural. Questão de DNA. Só a garra do vocalista e guitarrista Rickard, a técnica do baterista Joan e performance da excelente baixista Asa não deixam margem à dúvidas. Foi lindo. Esporrento, virulento, da porra! Tanto que, após o show, parte da platéia foi embora! Cool. Aliás, o público só abriu mão do conforto das cadeiras já no final da apresentação do Hell on Wheels.

Bem, aqui vai um desabafo de 11 anos. Talvez me arrependa mortalmente do que escreverei abaixo, mas, quer saber, dane-se! Ontem realizei um sonho que julgara inacessível, proibido. Já posso morrer em paz. A partir de agora, estou livre para vender pamonha de puro milho verde em Piracicaba ou para plantar pimenta vermelha no noroeste do Paraná. O que vier é lucro... não almejo mais nada, não tenho mais ambições... Sendo assim, pro raio que o parta a seriedade e o "compromisso jornalístico". Me diverti paca! Alcancei a plenitude espiritual sem precisar de dogmas, mantras, Jesus Cristo, Espírito Santo, Freud, psicotrópicos e tal. E você, nobre leitor deste site, tem três opções agora que está lendo estas indigitadas linhas:
a) morder os cotovelos de inveja;
b) me dar os parabéns;
c) me mandar tomar no Hemisfério Sul... A escolha é sua!
Pra mim, tanto faz. Já se você tiver se divertido tanto quanto eu, entre em contato comigo e vamos tomar umas brejas e trocar umas idéias. Eu pago a conta!

Bem, o show do Teenage Fanclub... Os caras entram em cena. Norman Blake manda um sonoro "Boa Noite" e Raymond McGinley ataca com "About You". Na seqüência, "Start Again". Gerard Love tira do bolso a fantástica "Don't Look Back". Tudo perfeito. Três vozes afinadíssimas, três compositores fenomenais e, parte da platéia, composta de jornalistas, alcança o Nirvana. A outra parte (não vi este fato inusitado, pois não desgrudei os olhos um só segundo do palco) dormia. Fato, no mínimo, engraçado... O TFC é assim mesmo, inofensivo. Quem não gosta pode aproveitar para tirar um cochilo na boa.

A banda priorizou de início o repertório do "Songs From Nothern Britain". Deste álbum, tocaram, além da já citada "Start Again", "Ain't That Enought" (a preferida de Nick Hornby), a excepcional "I Don't Want Control of You" e, finalmente, a que mais gosto do disco, "Speed of Light". A partir daí, comecei a pedir desesperadamente ao Gerard Love para tocarem "Spark's Dream". O cara ouviu, olhou para mim, riu e ficou na dele. Implorei ao baixista porque ele é o dono da música... preferiram tocar "What You do to Me". Nada mau.

Não posso reclamar do que veio em seguida, "The Concept", música que escuto diariamente desde 1993. Chorei. É, me derramei em lágrimas. Pode me chamar de boiola que não ligo. Sou macho pra cacete! Por trás deste choro estava engasgado um desabafo de 11 anos, a prova definitiva que podemos botar fé porque às vezes dá pé. Tudo bem, já tinha perdido a sanidade, me exposto ao ridículo. Pela primeira vez na vida dediquei-me ao "air guitar". Cara, 11 anos são 11 anos!

Continuei a implorar por "Spark's Dream". Para minha surpresa, quem anunciou a boa nova foi Norman Blake! Bicho, desculpe a liberdade, mas aquilo foi tocado em minha homenagem. Pelo menos na minha fantasia, do jeito que guardarei para o resto da vida. Nem vale a pena contar como fiquei durante a execução da música. Agradeci aos caras, simples assim.

Ainda teve "I Need Direction", "Star Sign", "Mellow Doubt", "Verisimilitude". E ainda ficou faltando "Planets", "Neil Jung", "Sidewinder"...

Do fundo da minha alma, quero agradecer ao RecifeRock, Coquetel Molotov e, principalmente, a Norman Blake, Raymond McGinley, Gerard Love e Francis MacDonald. Vocês conseguiram realizar o sonho da minha vida. Obrigado.
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Se o New Order vier ao Brasil de novo, eu sou capaz de escrever algo parecido...

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